A onda de intoxicações por metanol, que já soma 59 casos suspeitos e confirmados em diferentes estados, colocou em evidência o crescimento do mercado ilegal de bebidas alcoólicas no país. Dados da Associação Brasileira de Combate à Falsificação (ABCF) apontam que, entre 2020 e 2024, o número de fábricas clandestinas interditadas saltou de 12 para 80 — média de uma a cada cinco dias.
Nos últimos dias, oito mortes em São Paulo e Pernambuco foram relacionadas ao consumo de produtos adulterados, o que levou a Câmara dos Deputados a acelerar a votação de um projeto de lei que transforma em crime hediondo a falsificação de bebidas e a adulteração de alimentos.
Segundo o “Anuário da Falsificação”, publicado pela ABCF, apenas nos oito primeiros meses de 2024, 185 mil garrafas de bebidas adulteradas foram retiradas de circulação — o que equivale a uma apreensão a cada menos de dois minutos. Estimativas do setor apontam que 36% dos destilados vendidos no Brasil são falsificados.
“O combate precisa ir além da apreensão de lotes e atingir a estrutura do crime, que envolve lavagem de dinheiro, sonegação fiscal e acesso facilitado a insumos”, afirma Rodolpho Ramazzini, diretor da ABCF, que defende a retomada de sistemas de rastreamento abandonados há quase dez anos.
O Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) estima que o faturamento anual das organizações criminosas com a venda de bebidas falsificadas chegue a R$ 62 bilhões. Entre 2016 e 2022, o volume de produção irregular dobrou, alcançando 256 milhões de litros. “A falsificação financia atividades como o tráfico de drogas e armas, além de gerar evasão de divisas e riscos à saúde pública”, alerta Nivio Nascimento, assessor do FBSP.
As bebidas mais visadas pelos falsificadores são uísque, gim e vinho. A tendência atual mostra queda no contrabando de garrafas importadas e avanço da produção ilegal dentro do território nacional.
Operações e prisões
Nesta semana, a Polícia Federal e o Ministério da Agricultura iniciaram fiscalizações em fábricas e depósitos suspeitos na Grande São Paulo, em Sorocaba e no interior paulista. Em Embu das Artes e Pilar do Sul, agentes localizaram estabelecimentos usados para estocar e distribuir bebidas adulteradas.
A Polícia Civil também prendeu duas mulheres em Dobrada (SP) com 162 garrafas de uísque falso que seriam revendidas em Jaboticabal. Já na capital paulista, dois irmãos são investigados por adulterar bebidas no Campo Limpo, onde foram apreendidos quase 2 mil lacres e rótulos falsificados.
Além disso, 17,7 mil garrafas foram encontradas em Americana e um lote de 128 mil unidades foi lacrado em Barueri por falta de documentação.
Endurecimento da lei
A aprovação em regime de urgência do projeto de lei que torna a falsificação crime hediondo promete endurecer as penas, que passariam de quatro a oito anos para seis a 12 anos de prisão. O enquadramento também restringe benefícios como progressão de regime e indulto.
A proposta estava parada desde 2007 na Comissão de Constituição e Justiça e voltou à pauta após a repercussão das mortes recentes. A expectativa é de que a análise final ocorra de forma rápida no plenário da Câmara.



