A American Heart Association (AHA) atualizou as diretrizes de primeiros socorros para bebês e crianças. Veja o que mudou e como aplicar as manobras corretamente.
A cena é comum e assustadora: durante a refeição, a criança começa a tossir e, de repente, parece não conseguir respirar. Em momentos como esse, o desespero toma conta dos pais — mas manter a calma e saber o que fazer pode salvar uma vida.
Pensando nisso, a American Heart Association (AHA) divulgou, na última quarta-feira (22), uma atualização das diretrizes internacionais sobre manobras de desengasgo e ressuscitação cardiopulmonar (RCP) em bebês e crianças. As novas recomendações substituem as de 2020 e trazem mudanças importantes na forma de agir diante de uma obstrução das vias aéreas.
Segundo Valéria Bezerra, coordenadora nacional do Curso Suporte Básico de Vida (BLS) da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), essas atualizações são feitas a cada cinco anos e baseadas em novas evidências científicas.
“Estávamos esperando com ansiedade as novas normas. Elas refletem estudos recentes que mostram maior eficácia e segurança nas manobras”, explica a especialista.
🧠 Primeiro passo: identificar a gravidade do engasgo
Antes de qualquer ação, é preciso observar os sinais da criança ou bebê. As manobras de desengasgo só devem ser realizadas em casos de obstrução severa, ou seja, quando a vítima:
- Não consegue tossir ou chorar;
- Apresenta coloração pálida ou arroxeada;
- Fica mole ou sem força;
- Não respira.
Se o bebê ou a criança ainda consegue tossir ou emitir sons, a recomendação é observar e estimular a tosse, sem interferir.
Em casos de obstrução grave, ligue imediatamente para o SAMU (192) e inicie as manobras.
👶 Para bebês (até 1 ano de idade)
A principal mudança está na técnica das compressões torácicas. Antes, usavam-se dois dedos (indicador e médio); agora, deve-se utilizar o calcanhar da mão, garantindo maior pressão e eficácia na expulsão do corpo estranho.
Passo a passo atualizado:
- Apoie o bebê de bruços sobre o antebraço, mantendo a cabeça mais baixa que o corpo.
- Sustente a cabeça e o maxilar com firmeza.
- Dê cinco pancadas firmes nas costas, entre as escápulas.
- Se não funcionar, vire o bebê de barriga para cima.
- Faça cinco compressões torácicas no centro do peito.
- Alterne entre as pancadas e as compressões até a desobstrução ou até o bebê perder a consciência.
⚠️ Atenção: não faça compressões abdominais em bebês — o procedimento pode causar lesões internas.
💗 Ressuscitação cardiopulmonar (RCP) em bebês
Se o bebê perder a consciência:
- Coloque-o de barriga para cima sobre uma superfície firme.
- Realize 30 compressões torácicas com os dois polegares, circundando o tórax com as mãos.
- Se o objeto for visível, retire-o com cuidado (nunca tente “pescar” sem vê-lo).
- Faça duas ventilações boca a boca, cobrindo boca e nariz do bebê.
- Continue alternando compressões e ventilações até o bebê voltar a respirar ou o socorro chegar.
👧 Para crianças (a partir de 1 ano)
A principal novidade é a ordem das manobras: antes começava-se diretamente com as compressões abdominais (manobra de Heimlich). Agora, a orientação é iniciar com cinco pancadas firmes nas costas.
Como fazer:
- Ajoelhe-se atrás da criança.
- Dê cinco pancadas firmes entre as escápulas, usando o calcanhar da mão.
- Se não resolver, faça cinco compressões abdominais:
- Posicione-se atrás da criança.
- Coloque um punho logo acima do umbigo e abaixo do osso do peito.
- Segure o punho com a outra mão e pressione para dentro e para cima.
- Alterne entre as pancadas nas costas e as compressões até o objeto ser expelido ou até a criança perder a consciência.
Caso a criança esteja em cadeira de rodas ou seja impossível abraçá-la pela cintura, devem-se realizar compressões no peito.
❤️ RCP em crianças
Se a criança desmaiar:
- Deite-a sobre uma superfície firme.
- Faça 30 compressões torácicas com uma ou duas mãos, mantendo os braços esticados.
- Se possível, remova o objeto visível.
- Realize duas ventilações boca a boca, cobrindo a boca da criança e tampando o nariz.
- Continue o ciclo até o retorno da respiração espontânea ou a chegada do socorro.
🍼 Engasgo com líquidos: o que muda
As manobras de desengasgo devem ser usadas somente em casos de obstrução por sólidos (como alimentos ou brinquedos).
Segundo Tania Zamataro, do Departamento Científico de Segurança da Criança e do Adolescente da Sociedade de Pediatria de São Paulo, o engasgo por líquido raramente causa obstrução total das vias aéreas.
“O líquido não se comporta como um corpo estranho sólido, portanto, não há necessidade de manobras de expulsão”, explica.
Nesse caso, o ideal é:
- Retirar o excesso de líquido da boca;
- Manter o bebê em posição vertical;
- Observar — na maioria das vezes, ele se recupera sozinho;
- Se não melhorar, fazer uma leve estimulação nas costas;
- Se houver perda de consciência, iniciar a RCP.
🚫 Erros que devem ser evitados
- Não dar tapinhas leves nas costas — as pancadas devem ser firmes e direcionadas.
- Nunca colocar o dedo na garganta do bebê ou da criança, pois o objeto pode ser empurrado ainda mais para baixo.
- Evite tentar puxar o objeto sem enxergá-lo.
🎓 Treinamento faz a diferença
A AHA recomenda que pais, cuidadores e educadores participem do curso “Família e Amigos”, com cerca de duas horas de duração. O treinamento ensina de forma prática as técnicas de desengasgo e RCP — conhecimentos que podem ser decisivos em situações de emergência.
“Saber agir nos primeiros minutos pode salvar uma vida. A informação e o preparo são as maiores armas contra o pânico”, reforça Valéria Bezerra.
Fontes: American Heart Association (AHA), Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), Sociedade de Pediatria de São Paulo (SPSP)



